GUIAS

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

A CHACINA DE UNAÍ - Delator reafirma que Norberto Mânica é mandante; defesa contesta delação

Hugo Pimenta contou versão com detalhes do planejamento da Chacina de Unaí
Advogado de Norberto Manica diz que depoimento foi ‘patético’


              O delator da Chacina de Unaí, Hugo Pimenta, reafirmou durante o júri, nesta quarta-feira (151028) em Belo Horizonte, que Norberto Mânica foi o mandante do crime, ocorrido em 28 de janeiro de 2004, no Noroeste de Minas Gerais. O empresário contou em detalhes a versão dele para o crime, desde as conversas e a decisão de contratar pistoleiros para matar o fiscal. Ao longo do depoimento, que durou mais de três horas, as defesas do fazendeiro e de José Alberto de Castro apontaram supostas contradições entre a fala de Pimenta no Tribunal do Júri e nos registros do acordo de delação, tentando por em xeque o acordo de colaboração.

              O fazendeiro Norberto Mânica e o empresário José Alberto de Castro, julgados nesta semana, são acusados de serem mandante e intermediário da contratação dos executores das mortes. Os fiscais mortos apuravam denúncias de trabalho escravo. Os dois réus não acompanharam o depoimento de Pimenta no local do júri a pedido do empresário.

              Arrolado como testemunha da acusação e da defesa, o delator também é réu no processo e deverá ser julgado em novembro. Segundo ele, Castro teria intermediado o contato entre Norberto Mânica e Chico Pinheiro, que era acusado de ser agenciador dos executores do homicídio dos quatro servidores do Ministério do Trabalho, e que morreu há dois anos.

              De acordo com o delator, a intenção era matar somente o fiscal do trabalho Nelson José da Silva, porém diante das circunstâncias, todos que estavam com ele em um veículo – outros dois fiscais e um motorista – foram executados. Silva era conhecido por ser rigoroso e ter conduta ilibada. Ainda segundo o delator, o crime levou cerca de dois meses para ser executado e, por causa da demora, ele não acreditava que iria ocorrer de fato.

              Segundo Pimenta, por orientação de advogados, inicialmente, ele não falou sobre o que sabia a respeito da chacina. Ele não quis citar o nome dos defensores. "Eu já não aguentava mais a pressão disso aí. E a única opção que eu tinha para mostrar quem é quem, a verdade, era através da colaboração premiada", disse.

              A delação, cujo acordo foi firmado em 2007, foi alvo de contestação pela defesa. “O depoimento do Hugo hoje foi patético. As contradições, a quantidade de vezes que voltou atrás. (...) Ele mente o tempo inteiro, ele volta atrás, ele esconde prova, ele ilude o Ministério Público, se é que ilude. Talvez o Ministério Público quisesse ser iludido”, afirmou o advogado do fazendeiro, Antônio Carlos de Almeida – o Kakay.

              Um dos pontos questionados pela defesa de Mânica é uma suposta a gravação de uma conversa entre Castro e Mânica sobre o crime, citada no acordo de delação. Durante o júri, Hugo Pimenta afirmou que nunca entregou o registro porque ele foi destruído por José Alberto de Castro à época do crime.

              “O Ministério Público deveria ter a dignidade de, hoje, pedir o fim da delação dele. (...) Eu esperava do Ministério Público uma imediata manifestação, dizendo ‘nós vamos retirar o benefício do Hugo’”, argumentou o advogado.

              O defensor de Hugo Pimenta, Lúcio Adolfo, rebateu as contestações feitas por Kakay. "O Ministério Público, no dia 19 de outubro, quando renovou, fez o novo termo, atualizou o termo de delação, ele já tem ciência disso. A defesa está querendo se valer da inexistência de uma prova que lhe desfavorecia", pontuou. Segundo Adolfo, outra gravação de uma conversa do cliente dele com Mânica foi entregue ao MPF.

              Assim como a defesa de Mânica, o advogado de Castro, Cleber Lopes, também tentou apontar contradições na fala de Pimenta. "Tudo o que eu falei aqui hoje é o que aconteceu", afirmou o empresário, diante de umas das perguntas de Lopes, acrescentando que, se há informações conflitantes, ele se equivocou anteriormente.

              Ao fim do depoimento, a defesa de Castro chegou a pedir uma acareação entre o cliente e o delator. O juiz Murilo Fernandes de Almeida, então, determinou que Hugo Pimenta não fosse dispensado por causa da possibilidade de ficar frente a frente com o outro réu.

              Durante as mais de três horas em que Hugo Pimenta depôs, em nenhum momento, ele citou o envolvimento de Antero Mânica com o crime. Ele também é apontado pelo Ministério Público Federal como mandante do crime, e o julgamento está marcado para o dia 4 de novembro.

              Durante o segundo dia de julgamento, houve momentos de tensão, como uma ocasião em que o advogado de Mânica e Hugo Pimenta se desentenderam. "Isso não é tom de fazer pergunta", disse o juiz, repreendendo o advogado Kakay e sendo aplaudido pelos presentes.

              O encerramento da sessão também foi tumultuado. Ao fim do depoimento da última testemunha da defesa, o advogado Pedro Araújo, o magistrado não permitiu que perguntas de dois jurados fossem feitas por entender que o questionamento refletia o modo como os integrantes do júri estão pensando. Diante disso, ele destruiu a folha em que estavam escritas as perguntas, e a defesa contestou.

              Ao todo, 12 pessoas foram ouvidas nesta quarta-feira. Com encerramento da fase de oitiva de testemunhas, a previsão é que nesta quinta-feira ocorra o interrogatório dos réus, a leitura de peças e exibição de mídias.