GUIAS

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

A CHACINA DE UNAÍ - Testemunha diz em júri que Norberto Mânica atendeu ligação sobre mortes

Delegado aposentado da PF investigou empregados e fazenda em 2004
Norberto Manica e mais um são acusados da chacina de Unaí


              O delegado aposentado da Polícia Federal Antônio Celso dos Santos disse na manhã desta quarta-feira (151028), durante depoimento no segundo dia do júri popular do processo da chacina de Unaí, em Belo Horizonte, que Norberto Manica atendeu o telefone na manhã em que três auditores do Ministério do Trabalho e um motorista foram mortos em uma emboscada, em janeiro de 2004. De acordo com a defesa do fazendeiro, ele não atendeu às ligações neste dia.

              O fazendeiro Norberto Manica e o empresário José Alberto de Castro são acusados de serem mandante e intermediário da contratação dos executores das mortes. Os fiscais apuravam trabalho escravo na região onde Manica tem uma fazenda, no Noroeste de Minas Gerais. O alvo da execução seria, segundo testemunhas, Nelson José da Silva, um dos fiscais mortos. Ele era conhecido por ser rigoroso e ter conduta ilibada.

              Segundo o processo, José Alberto de Castro ligou para o telefone fixo da fazenda logo após a execução das vítimas. De acordo o delegado aposentado, os empregados da fazenda disseram, durante investigação em 2004, que a ligação recebida na fazenda era para Norberto. O advogado de Manica, Antônio Carlos de Almeida Castro – o Kakay -, tem dito que não há provas de que seu cliente tenha atendido o telefone na manhã do dia 28 de janeiro de 2004, apesar de o aparelho ficar na fazenda.

              O delegado também disse que, durante a investigação, foi verificado que Norberto havia ameaçado o fiscal Nelson José da Silva. A viúva de Nelson falou sobre esta ameaça, durante depoimento nesta terça-feira (151027). "Já era um fato [homicídio] esperado por ele. Ele me falou várias vezes que ia acabar levando um tiro na cabeça", disse Elba. Ainda disse que Norberto teria intimidado o marido com um chuço usado na lavoura de feijão. "Isso é bom para enfiar na barriga de um preto", afirmou Elba se referindo à forma como Nelson relatou o caso.

              Durante a manhã desta quarta, o juiz federal Murilo Fernandes de Almeida, que preside o julgamento, também colheu depoimentos de mais quatro testemunhas. dentre eles dois agentes da Polícia Federal que participaram das investigações, um perito da Polícia Civil e um gerente da fazenda de Manica.

              Para a tarde, está previsto o depoimento do também réu Hugo Pimenta, delator no processo que será julgado em 10 de novembro. Na terça-feira (151027), 13 testemunhas de acusação foram ouvidas.

              'O patrão tinha pedido'
              Erinaldo de Vasconcelos, condenado a 76 anos por ter participado da morte dos servidores, também apontou Norberto Manica como mandante do crime em depoimento.

              "Tinham fiscais que 'tavam' dando muito trabalho a ele (Norberto)", disse ao ser perguntado sobre a razão da contratação dele para matar os fiscais e o motorista. O condenado disse que “o patrão tinha pedido”. Os procuradores do Ministério Público Federal perguntaram quem era o “patrão” e Erinaldo respondeu: “Manica”. Ele contou que recebeu R$ 40 mil pelo serviço.

              O advogado de Norberto Manica, Antônio Carlos de Almeida Castro – o Kakay -, disse que não há provas que incriminem seu cliente. Ele insiste em dizer que os telefonemas que comprovariam a ligação de Norberto com os assassinatos são insuficientes já que ele não atendeu nenhuma das chamadas.

              O advogado ainda acredita que Hugo Pimenta seja o verdadeiro mandante da chacina. “Eu acredito que o Hugo, ele, infelizmente, coordenou a operação”.

              Além dos dois réus, ainda serão julgados o ex-prefeito de Unaí, Antério Manica, irmão de Norberto, e o delator Hugo Alves Pimenta. Este último conseguiu que seu processo fosse desmembrado e será julgado separadamente, no dia 10 de novembro. O ex-prefeito enfrentará o júri no dia 4 de novembro, todos na mesma corte.

A CHACINA DE UNAÍ
              Em 28 de janeiro de 2004, os auditores fiscais do Ministério do Trabalho Nélson José da Silva, João Batista Soares Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves, e o motorista Aílton Pereira de Oliveira foram assassinados em Unaí, na Região Noroeste de Minas Gerais. Eles investigavam denúncias de trabalho escravo em uma das fazendas de Norberto Manica, irmão do então prefeito da cidade, Antério Manica. O episódio ficou conhecido como a chacina de Unaí.

              O primeiro julgamento, ocorrido em 2013, durou quatro dias e terminou com a condenação de três réus. Rogério Alan Rocha Rios pegou 94 anos de prisão; Erinaldo de Vasconcelos Silva, 76 anos e 20 dias; e William Gomes de Miranda, 56 anos. Ao todo, as penas somam 226 anos.

              O processo tinha nove réus, mas Francisco Elder Pinheiro, acusado de ter contratado os matadores, morreu há dois anos e Humberto Ribeiro dos Santos, segundo a defesa, teve a pena prescrita.

              Segundo o MPF, a demora no julgamento do processo também acarretou a prescrição de outros dois crimes – o de resistência, que pesava sobre Norberto Manica, e o de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, atribuído a Antério Manica.

              O julgamento de Norberto, Pimenta e Castro seria em 2013, mas foi adiado no dia anterior à realização por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal - STF Marco Aurélio Mello. A decisão se deveu ao pedido defesa do fazendeiro para transferir o processo para a Justiça Federal em Unaí. Em abril deste ano, o STF manteve o júri na capital mineira.